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setembro 14, 2018Epilepsia é um tipo de doença neurológica bastante comum. Na verdade, não é apenas 1 doença, mas sim um conjunto de doenças que apresentam uma expressão parecida, que é a recorrência de crises epilépticas. Estima-se que cerca de 1 a 2 % da população tenha epilepsia, o que a torna uma doença muito comum na população geral, a despeito de ser pouco comentada. A falta de informação acaba alimentando o preconceito e diversos conceitos equivocados acerca desse transtorno, dificultando ainda mais a vida dos portadores e familiares.
O termo Epilepsia se refere a uma disfunção cerebral localizada ou difusa que torna o portados predisposta a ter eventos (crises), com alteração transitória da função cerebral. Os eventos são padronizados em cada paciente (esteriotipados) e apresentam uma duração de segundos a minutos, normalmente com reversão completa. Para definir o transtorno geralmente o paciente precisa apresentar tendência a recorrência de crises (2 ou mais) em situações cotidianas (crises não provocadas por eventos precipitantes óbvios e evitáveis). Interessante notar que crises isoladas ou motivadas por um desencadeante óbvio podem não configurar EPILEPSIA.
Crise epiléptica é o evento em sim, trata-se de uma OCORRENCIA, sendo EPILEPSIA o termo que significa tendência de recorrência, sendo, portanto, uma DOENÇA, marcada por crises recorrente do tipo epiléptico.
O risco de uma pessoa ter uma crise epiléptica isolada ou contextual durante a vida (sem configurar necessariamente EPILEPSIA) é de cerca de 4 a 5%, sendo a maioria delas em contextos específicos, como quadros infecciosos, febre alta, distúrbios do sódio no sangue, abuso de substâncias, traumatismos, etc.
A Epilepsia pode ocorrer em qualquer idade, acometer pessoas de qualquer raça ou condição social. É mais frequente em crianças e idosos, mas não se restringe a esses grupos. Trata-se de uma doença muito heterogênea, havendo casos bastante simples e de fácil solução e casos bastante graves e de evolução dramática.
Existe uma frase interessante que diz: TODO MUNDO QUE TEM UM CÉREBRO PODE TER EPILEPSIA. Gosto dessa frase pois versa sobre epilepsia como uma manifestação estritamente neurológica, como ocorrência democrática, reduzindo o preconceito e colocando a expressão clínica dentro da óptica de uma doença como outra qualquer.
TIPOS DE CRISES EPILÉTICAS
Existem diversos tipo de crise epiléptica, não apenas a famosa CONVULSÃO, que sempre vem a mente quando pensamos no transtorno. Dividimos inicialmente as crises epilépticas em 2 GRANDES GRUPOS bem diferentes: as crises FOCAIS e as CRISES GENERALIZADAS:
1- Crises Focais:
Crises de inicio localizado. Nesse tipo de crise o paciente tem uma alteração que se inicia em um grupo de neurônios bem localizado no cérebro, chamamos de FOCO EPILÉPTICO. Esse foco pode estar em qualquer lugar, geralmente em apenas um dos lados do cérebro.
Nas crises focais o paciente pode perceber o início da crise, sendo o sintoma relacionado à função do cérebro naquele lugar.
Por exemplo: uma crise que comece na área da movimentação levará o paciente a apresentar uma contração muscular involuntária. Se começar em uma área de sensibilidade, o sintoma inicial pode ser de um formigamento, se for em uma área relacionada ao olfato, pode ser a área receptora de cheiro, e assim por diante.
As crises focais são divididas em: motoras, sensitivas, olfatórias, visuais, psíquicas, autonômicas, etc.
A crise focal pode acometer a consciência ou não. Se não acometer, o paciente estará desperto e lúcido durante a crise. Chamamos de crise parcial simples quando a consciência está preservada e de crise parcial complexa quando o paciente perde a consciência.
Interessante pontuar que uma crise focal pode evoluir parar uma crise generalizada, com o acometimento progressivo para outras áreas do cérebro. Por isso que o importante nessa classificação é o começo da crise.
Essa diferença é importante pois a crise focal surge em contexto de doenças FOCAIS, localizadas, como cicatrizes, tumores, isquemias, malformações, etc. Regiões “machucadas” podem evoluir para um foco epiléptico localizado. Mesmo assim, muitos pacientes não apresentam alteração na imagem, demostrando que esse FOCO pode ser identificável ou não.
2- Crises Generalizadas:
Crises generalizadas são crises de início DIFUSO, que acometem diversas regiões do cérebro, nos dois lados, simultaneamente. Esse tipo de crise mais difusa, frequentemente leva a perda de consciência. Tem inicio abrupto e o paciente geralmente não sente um “AVISO” antes da crise começar.
A famosa convulsão está nesse grupo, assim com a crise de ausência (comum na infância). A convulsão (chamada mais corretamente de crise tônico-clônico-generalizada, ou CTCG) é o tipo mais conhecido e assustador de crise para um leigo. É marcada por desmaio (perda de consciência), excesso de salivação, movimentos motores vigorosos, mordedura de língua, pele arroxeada, perda urinária, confusão mental pós crise, etc.
As crises de início generalizado são decorrentes de patologias mais difusas, pois o cérebro sofre a crise de modo difuso, não focal. Acredita-se que a maioria dessas crises seja fruto de epilepsias genéticas ou de patologias sistêmicas, como crises por queda da glicemia, do sódio, privação de sono, uso de substâncias (álcool medicamentos, etc).
OBS – Vale frisar novamente que CRISES FOCAIS podem evoluir com GENERALIZAÇÃO. Pois isso a classificação é pautada com os sintomas do INÍCIO da crise.
CAUSAS DA EPILEPSIA
Epilepsia não é uma doença, mas sim um conjunto de doenças com expressão neurológica semelhante. As crises são fruto de DESCARGAS elétricas anormais de um grupo de neurônios. Entende-se a EPILEPSIA como um excesso de atividade cerebral, localizada ou generalizada.
Várias doenças podem causar um foco de epilepsia. De doenças genéticas a doenças adquiridas por algum machucado no sistema nervoso central. Isquemias, infecções, traumatismos, tumores (benignos ou malignos), malformações, doenças genéticas, entre muitas outras.
EXAMES QUE PODEM AJUDAR NO DIAGNÓSTICO
O diagnostico de Epilepsia é em grande parte clínico, baseado nas queixas dos pacientes, nos relatos pessoais e em relatos das testemunhas dos eventos. Baseado nesses relatos o médico poderá determinar se a natureza do evento é neurológica ou não e se é compatível com epilepsia ou não. A partir daí, ele tentará determinar o tipo de crises (focal ou generalizada), tentará identificar o lado e a localização (no caso das focais) e baseado no contexto de manifestação, irá determinar possíveis processos que estejam provocando as crises, chamamos isso de etiologia, ou a causa do problema. Para determinar a causa e confirmar o tipo de epilepsia o médico poderá solicitar exames, sendo os mais importantes:
ELETROENCEFALOGRAMA (EEG):
Esse exame avalia as ondas cerebral, a manifestação elétrica da superfície do cérebro. Trata-se de um exame muito bom na pesquisa de epilepsia, não invasivo e de custo relativamente acessível. No entanto, trata-se de uma amostra da condição cerebral em um determinado tempo, geralmente cerca de 20 a 30 min., quando o paciente geralmente está fora da crise. Com isso, exames NORMAIS (sem alterações) não afastam completamente o diagnostico, uma vez que na epilepsia a manifestação pode ser eventual, de tempos em tempos. Quando alterado o médico irá avaliar e julgar se as alterações fazem sentido a luz do quadro clínico, sendo que algumas alterações nesse exame podem ser compatíveis com a normalidade. Resumindo: é um bom exame, mas o resultado pode vir normal em pessoas com epilepsia, e vir alterado em pessoais normais, por isso a análise deve ser confrontada com o quadro clínico, não sendo avaliada isoladamente.
RESSONÂNCIA MAGNÉTICA DO CÉREBRO (RNM):
Esse é um exame muito importante, principalmente para quem epilepsia focal (aquele que começa em um ponto do cérebro). A ressonância avalia a anatomia do cérebro, podendo identificar alterações estruturais que possam ser o foco do transtorno elétrico. Na impossibilidade de fazer uma ressonância, um exame alternativo seria a tomografia de crânio, mas sem o mesmo grau de detalhe. Na ressonância é possível avaliar a presença de tumor, malformações, regiões de falta de oxigênio, traumatismo, entre outras alterações. Agora, pessoas com epilepsia podem ter exame de Ressonância completamente normal também! Isso mesmo, se a crise não for focal, ou mesmo que ela for, se a lesão ou a disfunção for muito discreta, o exame pode não apontar nada. Nesses casos chamamos de epilepsia idiopática ou criptogênica, que significa respectivamente, sem causa determinada ou com causa abaixo do poder de detecção do método. Epilepsias sem lesão estrutural geralmente apresentam um controle mais fácil pelos remédios, mas existem exceções.
Outros exames: exames de sangue podem ajudar na análise do metabolismo como um todo, perfil hormonal, perfil vitamínico, função do fígado, rins, hemograma, etc. Podem ser bastantes úteis em uma primeira crise ou no seguimento clínico do paciente.
SPECT e VIDEO-EEG e LIQUOR:
exames feito para casos bem selecionados
TRATAMENTO DA EPILEPSIA
O tratamento da epilepsia deve ser feito de forma individualizada, segundo o tipo de crise, contexto clínico e causa da epilepsia.
A grande maioria dos pacientes conseguem obter um controle satisfatório de crises com 1 ou 2 medicamentos por via oral. Acredita-se que mais de 70% das epilepsias sejam bastante responsivas aos medicamentos. Isso torna a epilepsia uma doença tratável, com uso de remédios simples e pouco onerosos (a maioria a disposição do SUS). O problema ainda é a falta de diagnostico preciso e falta de seguimento especializado na rede pública nacional.
Em casos mais complicados o paciente pode exigir outras condutas adicionais, tais como cirurgia, associação de medicamentos, dietas específicas entre outras modalidades complementares.
A possibilidade de cirurgia é cogitada em epilepsias focais cujo o foco é passível de retirada, principalmente se o paciente não apresenta um bom controle apenas com medicamentos ou se a lesão preocupa do ponto de vista neurológico.
A cura da epilepsia é possível em ALGUNS CASOS, quando o transtorno se relaciona a uma fase específica da vida (Epilepsias benignas da infância, por exemplo), ou quando o foco é retirado cirurgicamente ou se tranquiliza com o tempo. Consideramos os pacientes que estão a mais de 2 anos sem crises, como candidatos a ficar sem medicamentos.
GRAVIDEZ E EPILEPSIA
A epilepsia é um transtorno comum, que pode acometer muitas mulheres em idade fértil, com desejo de engravidar. A gravidez em pessoas com epilepsia é plenamente possível e geralmente muito bem-sucedida, principalmente se coordenada e planejada adequadamente.
Trata-se de uma gravidez peculiar, necessitando de um seguimento de pré-natal de alto risco. É fundamental que a paciente decida engravidar em uma fase de melhor compensação de crises, com o aval de seu médico e com seguimento bem próximo. Nunca a paciente deve suspender medicamentos por conta própria. O risco de malformações pode ser ligeiramente maior em pessoas que usam remédios para epilepsia, ainda sim, as malformações não são frequentes nesse grupo de pacientes.
O risco e de crises também precisa ser bem avaliado durante a gestação, já que o corpo da mulher se modifica e isso pode alterar o gerenciamento da medicação. Por isso recomendamos sempre a associação entre um obstetra e o neurologista de confiança.
Pessoas com epilepsia podem ter parto normal ou cesárea e podem quase sempre amamentar seguindo algumas medidas de segurança. O risco do bebê ter epilepsia é geralmente baixo (próximo ao da população geral ou discretamente aumentado em algumas formas genéticas de epilepsia).
Recomendações: planejamento prévio, fase adequada, evitar suspensão ou troca abrupta de medicamento no decorrer da gravidez, seguimento de pré natal com especialista (alto risco), ajustes durante evolução e medidas de segurança no pós parto.
DIREÇÃO E EPILEPSIA
Existe muita discussão sobre esse tema. Ainda mais após recente acidente envolvendo um atropelamento no Rio de Janeiro envolvendo um paciente portador de epilepsia.
O transtorno epiléptico é bastante variável de um paciente para o outro, existem casos e casos. Acreditamos (baseados em estudos estatísticos de risco de acidentes), que paciente bem controlados possam sim gozar do seu direito de dirigir. Cada pais tem sua legislação acerca do tema, com critérios claros de inclusão e exclusão desse direito baseados nesse risco.
De modo geral, o risco de acidente de carro em epilepsia depende diretamente do grau de controle, do tipo de crise, da frequência dos eventos e da causa subjacentes. Paciente com crises controladas há mais de 1 ano, com uso regular de medicamentos, fazendo seguimento médico regular e portador de um tipo de epilepsia não agressiva, poderia sim pleitear seu direito de dirigir veículo. Isso com o aval de seu médico assistente e do perito do DETRAN.
O risco, nessas condições se assemelha ao risco inerente de acidente visto em outras condições médicas crônicas, como diabetes, por exemplo. Sabe-se que o risco de acidentes em diversas doenças mostra-se mais preocupantes, tais como alcoolismo, cardiopatias estruturais, arritmia, inexperiência ao volante, etc.
COMO AGIR DURANTE UMA CONVULSÃO
Bom, a crise convulsiva é um dos tipos de crise epiléptica, é o tipo mais intenso; o paciente perde a consciência (desmaia, não responde aos estímulos externos), cai no chão e se debate.
Além da perda de consciência e as contrações involuntárias nos membros o paciente pode apresentar aumento de salivação, alteração da coloração da pele (que pode ficar mais arroxeada, principalmente na região ao redor dos lábios). O paciente pode morder a língua, geralmente em sua base, na região mais posterior (com isso pode haver sangue misturado com a saliva do paciente. Os olhos geralmente ficam entreabertos, mas não fixam nenhum objeto (sendo descritos comumente com revirados). Pode haver perda de urina, principalmente na fase final da crise.
Após o término da crise o paciente tem recuperação gradual, podendo ficar confuso, um pouco sonolento e por vezes até agressivo. Geralmente refere dores no corpo ou mesmo de cabeça. Essa fase de recuperação pode durar de 10 – 15 minutos até algumas horas.
Uma vez reconhecida a convulsão vamos falar um pouco sobre como reagir diante dela. É preciso ter em mente que a convulsão é um evento autolimitado. Dura geralmente entre 1 e 3 minutos. A crise começa, atinge seu ápice e cessa espontaneamente.
É extremamente raro uma crise que ultrapassa os 5 minutos, sendo nesses casos necessário a participação de um profissional habilitado e eventualmente utilização de medicação endovenosa.
Duas preocupações são pertinentes:
- O risco de traumatismos: uma vez que o paciente está inconsciente e apresentando contrações musculares vigorosas. Neste ponto a preocupação principal é com traumas na região da cabeça. Então na medida do possível deve-se tentar proteger o paciente desses traumatismos. Para tal devemos afastar todo e qualquer objeto do perímetro próximo do paciente, dando espaço suficiente para não ameaça a integridade fica do paciente em crise. Se necessários a cabeça pode ser suavemente contida, com as mãos, para evitar ferimentos nessa região mais nobre.
- Risco de engasgos: A língua não enrola sobre si mesma durante a crise, isso é anatomicamente impossível. O que pode ocorrer em alguns casos é a queda da base da língua causada pelo peso da língua e a inconsciência do paciente. Isso é minimizado virando o paciente de lado.
Não devemos tentar tracionar a língua do paciente durante a crise, sob o risco de acidentes em si (mordida ou contaminação) e com o paciente.
Algumas pessoas cientes do risco de lesão do atendente optam por introduzir objetos rígidos na boca do paciente a fim de afastar os dentes e manter a via aérea patente. Novamente é uma conduta inadequada. Ocorre risco de lesões dentária e gengivais graves, uma vez que a mordida associada à convulsão é muito forte. Dentes podem ser destruídos e fragmentos podem acabar entrando na via aérea, piorando o estado de saúde do paciente. Portanto, jamais introduza objetos rígidos na boca de alguém com crise.
O ideal é que o atendente (leigo) apenas vire o paciente de lado e coloque uma toalha ou um pano próximo à boca para conter as secreções.
Como se vê é mais importante saber o NÃO fazer do que propriamente o que se DEVE fazer. (a principal medida é não piorar o cenário).
Ainda sob essa óptica é importante ressaltar que NÃO se deve dar remédio ao paciente durante ou logo após a crise. Durante a crise o paciente está inapto a deglutição, o risco do medicamento cair na via respiratória ao invés do trato digestivo é muito alto. Do mesmo modo, logo após a crise a sonolência do paciente pode limitar sua capacidade de deglutir com segurança. Além do risco, o benefício de dar o remédio durante ou logo após a crise é mínimo, uma vez que o tempo de absorção de uma medicação via oral é de muitos minutos a horas, não havendo qualquer impacto para aquele episódio em si.
Após o término da crise é importante respeitar o período pós crítico, aonde o paciente pode manifestar certa confusão mental e mesmo alguma agressividade. Tente manter a calma e não tente conter fisicamente o paciente, isso pode deixá-lo ainda mais agressivo. Aguarda tranquilamente a recuperação do paciente.
Sendo a primeira crise convulsiva do paciente, este deverá ser conduzido até uma unidade de pronto atendimento para ser avaliado e realizar alguns exames. Caso o paciente tenha epilepsia já diagnosticada a condução dependerá das orientações do médico que acompanha o paciente.