Síndrome Pós-férias
janeiro 10, 2015Distimia
fevereiro 2, 2015A Miastenia Gravis é uma doença neurológica crônica marcada por fraqueza muscular. Chama atenção o carácter flutuante dos sintomas. O paciente acorda relativamente bem e vai piorando no decorrer do dia, com o esforço. A fraqueza pode ser generalizada ou bem localizada, acometendo membros, pálpebras, músculos que movem os olhos, músculos da deglutição e fala, etc.
A doença apresenta 2 formas clássicas (adquiridas) em adultos:
Forma Auto-Imune: forma mais comum, acometendo adultos jovens e predominantemente do sexo feminino (apesar de acometer homens eventualmente). Trata-se da produção de anticorpos que agem na junção entre o nervo e o músculo, dificultando a transmissão do impulso nervoso e a contração muscular. A causa é uma falha do sistema imunológico atacando (com anticorpos) um receptor da própria pessoa. São exemplos de outras doenças auto-imunes: o vitiligo, a psoríase, a diabetes tipo 1, a tireoidite de Hashimoto, lúpos, artrite reumatoide, etc.
Forma Paraneoplásca: forma mais infrequente, pode acometer pessoas mais idosas, acima dos 60 anos (tanto homens como mulheres). Nesta forma, um tumor oculto pode estar causando a miastenia. Geralmente trata-se de um tumor no Timo, uma glândula que fica acima do coração. Mas outros tumores já foram descritos, tais como: tumor de pulmão, mama, linfoma, etc. Nessa forma também existem anticorpos, mais a produção é induzida pela presença do tumor.
*Obs: existe a forma congênita, com passagem de anticorpos maternos e sintomas perinatais. Mas não abordaremos essa forma nesse texto.
Sintomas de Miastenia Gravis:
O sintoma principal é a fraqueza muscular flutuante, sua intensidade oscila durante o dia. Quanto maior o esforço, maior a fraqueza, como se “gastasse” a bateria muscular. Com o repouso a força pode se recuperar um pouco.
São sintomas comuns na Miastenia:
1) Ptose Palpebral: ocorre queda parcial ou todas das pálpebras, de um lado só ou de ambos. Essa fraqueza pode dificultar a visão (pois a pálpebra pode ficar na frente do olho.
2) Diplopia: esse é o termo médico para visão dupla . O paciente olhando com os dois olhos abertos enxerga duas imagens em algumas posições do olhar. Geralmente ao olhar para cima ou para os cantos, o paciente acaba enxergando uma imagem dupla, sendo uma mais nítida e outra uma espécie de sombra. Ao fechar um dos olhos o paciente volta a ver uma imagem só. Quem tem diplopia pode apresentar um estrabismo, um desalinhamento dos olhos, parecendo vesgo, principalmente quando faz muito esforço visual olhando para os cantos.
3) Alteração de fala e deglutição: alguns pacientes referem dificuldades de fala, principalmente em discursos prolongados. A voz pode ficar baixa e anasalada, com dificuldade de expressar alguns fonemas, fenômeno chamado de disartria. Da mesma forma, a deglutição pode ser prejudicada, causando risco de engasgos e mesmo pneumonias aspirativas. Em casos graves é necessário uso de sonda para alimentação.
4) Fraqueza nos membros: sintoma muito frequente. Braços e pernas podem ser acometidos. A piora geralmente é evidente ao final do dia ou após esforços repetitivos. Pode haver queixas como dificuldade em subir escadas, pendurar coisas no varal, abrir garrafas de refrigerante, abotoar camisa, praticar esportes, etc. Tudo dependerá da gravidade da fraqueza, da localização clínica e do contexto de cada um.
5) Fraqueza respiratória: esse é o sintoma mais grave e ameaçador da Miastenia Gravis. Falta de ar, respiração rápida e curta, fadiga respiratória. Trata-se de risco de vida e condução sempre hospitalar, na emergência ou na UTI. O paciente precisa de suporte, proteção e tratamento mais agressivo. Por vezes é necessário intubação e até traqueostomia para a fase lenta de recuperação. A maioria dos casos não atinge essa gravidade, mas a falta de reconhecimento precoce, pode aumentar o risco de evoluções desfavoráveis.
Diagnóstico:
O diagnóstico é feito geralmente pelo médico neurologista clínico e depende de uma forte suspeita clínica. O dado mais importante é a historia clínica minuciosa e direcionada. Um quadro arrestado de fraqueza com flutuação clínica, na ausência de sintomas sensitivos, autonômicos e de nervos cranianos é sempre um contexto propício ao diagnóstico. É fundamental atentar para ptose de pálpebras, visão dupla, alterações sutis de voz, etc. No exame clínico o médico tentará quantificar a fraqueza, delinear a distribuição clínica e tentará identificar a flutuação (chamamos de fadigabilidade, quando o paciente piora com o esforço repetitivo). Casos muito leves e vistos por não especialistas podem ficar meses a anos sem o diagnóstico correto e sem tratamento. Podem passar como fadiga crônica, depressão, fibromialgia, etc.
Exames que podem ser solicitados pelo médico:
1) Eletroneuromiografia (ENMG).
Na ENMG o médico testa a condução dos nervos e as respostas musculares de contração. Na miastenia o padrão típico é a fadigabilidade, com redução da resposta muscular vista aos estímulos repetidos (chamada de decremento da resposta). Agora, há de se ter muito cuidado quando o exame vem negativo, pois existem técnicas específicas para identificar miastenias leves e peculiares, nem todos são pegos em um exame padrão.
2) Anticorpo anti receptor de Acetilcolina (Anti-ACh).
Trata-se de um exame de sangue bastante específico, feito por alguns laboratórios. Ele pesquisa o anticorpo mais comum envolvido com a doença. No entanto, esse exame não pesquisa todos os anticorpos possíveis, cobrindo cerca de 70% dos casos. Dosagem de outros anticorpos são possíveis em laboratórios especializados ou em ambiente de pesquisa. Esses exames são úteis em casos selecionados.
3) Tomografia de Tórax com cortes finos.
.Esse exame se presta a buscar tumores na glândula TIMO. Por vezes, a Miastenia é causada por tumores benignos ou malignos do TIMO e raramente de outros órgãos. O TIMO, no adulto, geralmente é indetectável ou um remanescente muito pequeno.
4) Exames de sangue gerais.
Eles se prestam a afastar outras causas comuns de fraqueza muscular, de outra natureza. Deve sempre ser investigado inflamações musculares (dosando a CPK), doenças tireoidianas, alterações de hemograma, etc.
Tratamento da Miastenia:
A Miastenia é uma doença crônica e deve ser tratada cronicamente. O especialista responsável por esse tratamento é o médico Neurologista Clínico, eventualmente ao lado de fonoaudiólogo, fisioterapeuta e, em casos peculiares, psicólogos.
O tratamento envolve medicamentos de 2 tipos:
1) Para alívio dos sintomas: existem medicamentos que aumentam a ação da acetilcolina (na fenda entre o neurônio e o musculo). Esses medicamentos são usados diariamente, várias vezes ao dia, e visam melhorar a força muscular, melhorar a ptose, diplopia, fala e deglutição. Quando interrompidos os sintomas podem retornar em algum grau.
2) Para redução da produção de anticorpos: como dissemos acima, a miastenia é entendida com uma doença autoimune, aonde o sistema imunológico produz um ataque a receptores do próprio organismo. Sendo assim, uma vertente do tratamento é o ajuste do sistema imunológico, conseguido com uso de imunossupressores e imunomoduladores capazes de reduzir essa resposta. Aqui temos uma gama enorme de possibilidade, como os corticoides, azatioprina, ciclofosfamida, plasmaferese, etc.
3) Timectomia: a retirada cirúrgica do TIMO é reservada para casos graves ou em que é surpreendido um tumor no TIMO (chamado de Timoma)
Cada paciente precisará de um tratamento personalizado. A escolha dependerá do grau dos sintomas, dos músculos acometidos, da idade e sexo do paciente, assim como outras variáveis contextuais. Cada paciente é de um jeito e a evolução é bastante variável. Recomenda-se que o paciente evite sedativos e relaxantes musculares desnecessários.
Muitos adequadamente tratados conseguem levar uma vida muito próxima do normal. O seguimento é crônico e deve ser feito pelo médico neurologista.